Há 184 anos era cumprida a sentença de forca para um dos mais infames criminosos da história moderna de Portugal: Diogo Alves, o denominado “assassino do Aqueduto das Águas Livres”. As suas
violentas façanhas receberam tremenda atenção mediática, saciando o apetite pelo macabro habitualmente exibido pelas nossas sociedades. Ainda hoje a figura deste criminoso de origem galega que, juntamente com o seu bando, traumatizou a Lisboa oitocentista é alvo de debate histórico.

Foi um dos últimos condenados à morte no nosso país, executado a 19 de Fevereiro de 1841, e a sua cabeça foi conservada para análise frenológica e famosamente exposta no
Teatro Anatómico da FMUL, para onde “atrai muitos visitantes” sendo “quase um ícone”, nas palavras de um dos responsáveis pelo Instituto de Anatomia. É uma das curiosidades portuguesas referenciadas no guia de destinos turísticos alternativos
Atlas Obscura.
Motivou o que se pode considerar o primeiro filme de terror português: “
Os Crimes de Diogo Alves” (1911), de João Tavares. Esta é também a primeira obra analisada no livro “
O Quarto Perdido do MOTELX – Os Filmes do Terror Português (1911-2006)”, com o texto que lhe dedica Sérgio Bordalo e Sá, intitulado “Do Aqueduto para o formol”, a inaugurar em arrepio o nosso compêndio do terror luso.
Nessa dinâmica imitante da arte e da vida, o notável facínora e o filme que lhe foi dedicado nos primórdios do século XX serviram de inspiração ao primeiro
72 HOUR FILM PROJECT, um workshop de realização cinematográfica que aliou o MOTELX e a NOVA FCSH – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa. Em Junho do ano passado, um grupo de oito estudantes de Realização Cinematográfica dessa instituição, orientado pelo professor Pedro Florêncio, foi desafiado a escrever, realizar e montar uma curta-metragem de terror, com supervisão do realizador Fernando Alle (“
Mutant Blast”, “
Papá Wrestling”) e do director de fotografia André Mendes.
O resultado deste desafio foi
“Vislumbre”, um exercício cinematográfico que explora a ideia do único arrependimento do famoso assassino, numa encenação perturbadora que nos arrasta para a perspectiva de uma vítima de um
serial killer. É
esta curta-metragem, estreada na passada 18º edição do MOTELX, que temos agora o prazer de disponibilizar no nosso canal de YouTube.

O MOTELX reafirma assim o compromisso duplo de encorajar e divulgar a produção nacional de cinema de terror, com parceiros assíduos e militantes dos mesmos princípios de estímulo criativo como a NOVA FCSH, que
anuncia desde já a reedição desta iniciativa conjunta em 2025. O projecto assumirá agora o nome de
Laboratório Cinematográfico Quarto Perdido - MOTELX / NOVA FCSH – em referência directa à nossa
secção dedicada à história do cinema de género português –, e contará com a participação de estudantes do 1º e 2º ciclo de Ciências da Comunicação desta instituição, que
voltarão a criar um filme de terror em 72 horas, tendo agora 16 horas adicionais de trabalho.
E é com orgulho que
disponibilizamos esta curta-metragem, um objecto cinematográfico ímpar na sua génese e arrepiante na forma e conteúdo,
ao público que nos sustenta e apadrinha a criação de cinema de género em Portugal, no dia do aniversário da morte da tenebrosa figura que o inspirou.
